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Pois é, meus alunos, nos primeiros capítulos deste livro percorremos juntos a contabilidade da pessoa física.
Vimos como o controle de nossas receitas, despesas e investimentos pode ser traduzido em lançamentos contábeis simples.
Foi um exercício didático, aproximando a técnica contábil da vida real de cada um de nós, permitindo inclusive a elaboração de nossos balanços pessoais.

 

Agora chegou o momento de avançarmos para o estudo da contabilidade empresarial.
Contudo, antes de mergulharmos definitivamente na contabilidade das empresas, reservamos este capítulo para falarmos um pouco sobre a legislação que sustenta toda essa engrenagem contábil, pois esse conhecimento será fundamental para o desenvolvimento do nosso trabalho no próximo capítulo do nosso Livro Digital.

 

A base legal por trás da contabilidade

Essa base legal se apoia em leis, decretos e normas que foram sendo construídos ao longo da história.

 

Vamos dar uma olhada rápida nessa linha do tempo, partindo lá do ano de 1850:

  • 1850 – Código Comercial Lei nº 556/1850 primeiro marco legal da escrituração empresarial no Brasil.

  • 1891 – Primeira Lei das S.A. Decreto nº 434/1891 regulamentou as sociedades anônimas, mas sem regras contábeis detalhadas.

  • 1922 – Criação do Imposto de Renda Artigo 31, da Lei nº 4.625/1922.

  • 1924 – Primeiro Regulamento do IR Decreto nº 16.581/1924.

  • 1940 – Segunda Lei das S.A. Decreto-Lei nº 2.627/1940 trouxe capítulo específico sobre contabilidade.

  • 1946 – Criação do CFC e CRCs Decreto-Lei nº 9.295/1946 A profissão contábil ganhou um sistema de representação e fiscalização organizado, fortalecendo o contador brasileiro.
  • 1966 Código Tributário Nacional – CTN - Lei nº 5.172/1966 Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios.
  • 1976 – A grande virada na legislação contábil A Lei 6.404/1976 trouxe organização e padronização contábil, demonstrações obrigatórias, critérios de avaliação, auditoria independente.

  • 1977 – Outro grande marco O Decreto-Lei nº 1.598/1977 definiu as regras de apuração do Lucro Real e a criação do LALUR, separando o lucro contábil (apurado conforme a Lei 6.404) do lucro fiscal (aceito pelo fisco como base de cálculo).

  • 2002 – O Novo Código Civil, implementado pela Lei nº 10.406/2002 revogou quase que integralmente o Código Comercial e passou a disciplinar empresas, empresários e escrituração. Restou no Código Comercial, apenas a parte sobre o direito marítimo

  • 2006 A Lei do Simples Nacional Lei Complementar nº 123/2006 Institui o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte.

  • 2007/2009 – Alterações marcantes na Lei 6.404/76 As Leis 11.638/2007 e 11.941/2009 promoveram a convergência da contabilidade brasileira às normas internacionais de contabilidade (IFRS).
  • 2014 – Alterações significativas na Legislação tributária federal Lei nº 12.973/2014 fim do RTT e ajustes entre lucro contábil e fiscal.
  • 2018RIR-2018 Decreto nº 9580/2018 Regulamento vigente do Imposto de Renda Regulamenta a tributação, a arrecadação e a administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza.
  • 2025 – Lei da Reforma Tributária – Lei Complementar nº 214/2025 Criação do IBS, CBS e IS. Veja essa lei detalhada por links clicando AQUI facilitando sua pesquisa.

 

 

 

Além das leis e dos decretos, temos também as Normas Brasileiras de Contabilidade (NBCs) e o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC):

As Normas Brasileiras de Contabilidade (NBCs), emitidas pelo Conselho Federal de Contabilidade - CFC, existem há décadas e sempre foram o conjunto oficial que orienta toda a prática contábil no Brasil. Desde suas primeiras versões, as NBCs trataram de diversos aspectos da contabilidade, tais como princípios, reconhecimento e mensuração de fatos contábeis, elaboração de demonstrações financeiras, procedimentos técnicos e também normas de ética e conduta profissional.

 

Com o crescimento da globalização e a necessidade de padronização internacional das informações financeiras, especialmente a partir dos anos 2000, o Brasil iniciou um processo de convergência aos padrões internacionais IFRS (International Financial Reporting Standards), adotados por diversos países. Para viabilizar essa convergência, foi criado em 2005, pela Resolução CFC nº 1.055/2005, o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), responsável por elaborar pronunciamentos técnicos alinhados aos IFRS.

 

O funcionamento do sistema passou a ocorrer da seguinte forma: o CPC emite um pronunciamento técnico (ex.: CPC 27 – Ativo Imobilizado), e o CFC o converte oficialmente em uma norma brasileira, na forma de NBC-TG (Norma Brasileira de Contabilidade – Técnica Geral), conferindo-lhe validade normativa no país. Assim, muitos CPCs possuem correspondentes diretos em NBCs, como no exemplo: CPC 27 → NBC TG 27 – Ativo Imobilizado.

 

Importante destacar que o surgimento do CPC não substituiu as NBCs, mas fortaleceu e modernizou o sistema normativo brasileiro, integrando-o às exigências internacionais. Além das NBCs técnicas (NBC TG), que derivam dos CPCs, continuam existindo outras categorias de NBCs, como as voltadas para a auditoria (NBC TAs), perícia (NBC TP 01 / NBC PP 01) e ética profissional (NBC PG 01).

 

Por fim, destacamos a obrigatoriedade da Escrituração Digital e também do eSocial:

— Professor, posso fazer uma pergunta antes da gente seguir?

 

— Manda ver, Joãozinho.


— É que eu vi esse monte de leis aí em cima e fiquei com a pulga atrás da orelha. Tem lei de contabilidade, lei de imposto, decreto, CPC, NBC…

Que balaio de gatos, hein!


— Ah, Joãozinho, aí é que mora o perigo! Tem muita gente boa que se embanana justamente por não separar o contábil do fiscal.


— Como assim, professor?

 

— É o seguinte: há duas vertentes que caminham juntas, mas que nunca devem ser confundidas.

De um lado está a legislação contábil, que dita as regras de registro, mensuração e evidenciação — ou seja, a maneira correta de apurar o lucro contábil e traduzir em números a realidade econômica da empresa, baseado na ciência da contabilidade.

De outro, temos a legislação fiscal, que usa esse lucro contábil como ponto de partida, mas impõe ajustes, adições e exclusões para chegar ao lucro tributável, base sobre a qual incidem os impostos, que é o que interessa pro fisco.

 

— Então o lucro é um na contabilidade e outro pro imposto de renda?


— Exatamente, Joãozinho! O primeiro mostra o que a empresa ganhou de verdade; o segundo mostra o quanto o governo vai tributar.
A contabilidade busca retratar a realidade econômica; o fisco quer garantir a arrecadação. E cabe a nós, contadores, entender os dois mundos sem confundir um com o outro.

 

— Então o senhor quer dizer que o contador precisa ser bilingue?


— Boa, Joãozinho! Um verdadeiro tradutor de resultados: fala a língua da contabilidade, mas entende os dialetos do fisco.


— Entendi, professor. Um olho no lucro, outro no Leão!


— Exatamente, meu caro. Por isso, é fundamental que o profissional contábil saiba segregar bem os dois conjuntos normativos.

 

 

Isto posto, vamos separar então a normatização contábil da fiscal, apenas as mais relevantes e vigentes:

 

LEGISLAÇÃO CONTÁBIL VIGENTE

(Base para o lucro contábil e as demonstrações financeiras)

  • 1976Lei 6.404/1976 e suas atualizações (Leis 11.638/2007 e 11.941/2009) – estrutura das demonstrações, conceito de lucro líquido, e estabelece a convergência contábil - IFRS.
  • 2002O Novo Código CivilLei nº 10.406/2002 passou a disciplinar empresas, empresários e escrituração.
  • 2005Criação do CPC – harmonização com as normas internacionais (IFRS).

  • NBCs — normas técnicas contábeis.

  • SPED Contábil (ECD) – escrituração contábil digital.

     

LEGISLAÇÃO FISCAL VIGENTE (mais relevantes)

(Base para o lucro tributável e apuração de tributos)

  • 1966 Lei nº 5.172/1966 (CTN) – Código Tributário Nacional – dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios.
  • 1977Decreto-Lei nº 1.598/1977 – altera a legislação do imposto de renda, define o lucro real e os ajustes fiscais.
  • 1995 Lei nº 8981/1995 – introduz modificações na forma como a renda e os proventos de qualquer natureza são tributados, incluindo rendimentos e ganhos de capital percebidos por pessoas físicas residentes no Brasil.
  • 1995 Lei nº 9.249/1995 estabelece novas regras para a apuração e o pagamento do IRPJ e da CSLL, incluindo a possibilidade de benefícios fiscais para estabelecimentos hospitalares que comprovem se enquadrar no conceito legal de serviços médicos-hospitalares.
  • 1996Lei nº 9.430/1996 – estabelece normas para a apuração e pagamento de tributos, incluindo o imposto de renda, e define procedimentos administrativos relacionados à legislaçao tributária.
  • 2006 Lei Complementar nº 123/2006 Lei do Simples Nacional – Institui o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte.

  • 2014Lei nº 12.973/2014 – trouxe alterações significativas na legislação tributária federal relativa ao IRPJ, CSLL, PIS/Pasep e Cofins; revoga o Regime Tributário de Transição - RTT; dispõe sobre a tributação da pessoa jurídica domiciliada no Brasil, com relação ao acréscimo patrimonial decorrente de participação em lucros auferidos no exterior por controladas e coligadas.
  • 2018Decreto nº 9580/2018 (RIR/2018) – Atual Regulamento do Imposto de Renda.
  • SPED Fiscal (EFD) e eSocial – obrigações acessórias digitais.
  • 2025Lei Complementar nº 214/2025 – Reforma Tributária (IBS, CBS e IS). Essa lei marca o início de uma nova era tributária, que certamente impactará também a contabilidade das empresas

Assim, temos que caminhar com os dois pés firmes: um na contabilidade, pra entender como se apura o resultado da empresa, e outro no fisco, pra enxergar como esse resultado é tratado na tributação.

 

 

Joãozinho voltando a ação:

 

– Olha aqui professor João Leite, depois de ver toda essa engrenagem contábil ai, mesmo já sabendo que parte refere-se a execução contábil e parte a questão fiscal, estou muito preocupado. Será que o capítulo 7 do nosso Livro Digital vai ser um amontoado de teorias cheias de palavras difíceis?

 

– Fique tranquilo Joãozinho! A proposta aqui é simples. A ideia é colocar o aluno dentro do escritório contábil, como se fosse um estagiário recém-chegado. Imagine, sobre a mesa, pilhas de notas fiscais, comprovantes de pagamento, contratos e boletos. O dono da empresa liga perguntando sobre a situação do caixa. Um funcionário aparece com dúvidas sobre o salário. O fiscal cobra a entrega da obrigação acessória.

 

É nesse ambiente que a contabilidade acontece. Vamos reproduzir exatamente esse cenário. Não apenas conceitos soltos, mas um ciclo contábil completo, mês a mês, acompanhando a vida de uma empresa fictícia em seu primeiro ano de atividade.

 

A cada fato contábil, o estagiário vai sentir e entender, na prática, como a contabilidade acontece de verdade.

 

Joãozinho segue, curioso:

 

– Professor, mas e a teoria, fica de lado?

 

– Claro que não, Joãozinho. A teoria é essencial, mas aqui no nosso livro nós vamos priorizar a prática contábil. A teoria vai continuar aparecendo, mas sempre de forma bem pontual. A cada situação contábil, se surgir um conceito que precisa ser explicado, paramos para detalhar. Assim, a prática se mantém no centro, e a teoria cumpre seu papel de apoio.

 

Joãozinho não para:

 

– Então é tipo aprender fazendo, professor? Primeiro a prática, e a teoria vai entrando no caminho?

 

– Exatamente, Joãozinho. Aqui você não vai só “ouvir falar” de contabilidade. Vai viver contabilidade.

 

O aprofundamento teórico o aluno deverá buscar nos bons livros de contabilidade, que, aliás, deve ter na sua prateleira. Quer uma dica de livro? Clique AQUI e escolha aquele que entenda ser o mais adequado ao seu nível atual de conhecimento.

 

O importante é não esquecermos que, cada lançamento que vamos registrar no próximo capítulo, terá um pé na prática do dia a dia… e outro na lei que dá legitimidade a essa prática.

 

Pois bem, vimos que a contabilidade brasileira se apoia em um tripé — Leis, Normas e Práticas. Quem quer ser contador de verdade precisa conhecer esse alicerce e nunca parar de estudar.

 

Encerramos, assim, nossa viagem pela base legal da contabilidade.

 

 

Proposta para o Capítulo 7 do Livro Digital

Ao longo do próximo capítulo, vocês acompanharão:

  • Abertura da empresa e integralização do capital;

  • Lançamentos mensais, com registro de compras, vendas, despesas operacionais, encargos e tributos;

  • Folha de pagamento e encargos trabalhistas;

  • Balancetes mensais ao final de cada mês;

  • E, em dezembro, a elaboração do Balanço Patrimonial e das demais demonstrações financeiras exigidas pela legislação brasileira.

Isto posto, agora não tem mais volta…

 

Vamos vestir o terno da pessoa jurídica e encarar a contabilidade de uma empresa, mês a mês, ao longo de um ano inteiro. Assim, será possível compreender não apenas os conceitos, mas sobretudo a dinâmica da contabilidade.

 

Vai ter até comparativo de regimes tributários e também simulação da Reforma Tributária de 2026, já que adotaremos o próprio ano de 2026 como o ano base para esse nosso grande exercício prático.

 

Mas fiquem tranquilos: utilizaremos em nossa simulação contábil uma empresa limitada, com tributação pelo Lucro Real, mas sem complicações. A proposta maior é entender a contabilidade, no dia a dia da empresa, considerando a sua tributação básica. Vamos utilizar um modelo de plano de contas apropriado para empresas de pequeno porte, com algumas adaptações para facilitar a didática e consequentemente o aprendizado.

 

Preparados? Então venham comigo!

 

 

Este capítulo foi disponibilizado, originalmente, em 05/09/2001 - Repaginado e atualizado em setembro/2025.